sexta-feira, 31 de agosto de 2018

O Babismo

O Babismo - por Marcelo Carvalho




Tecerei algumas linhas com a minha experiência e percepção atual sobre os gurus da nova era, em especial,  sobre o guru popstar brasileiro, Janderson, conhecido como Prem Baba.


Essa semana (30/08), saiu em vários sites a notícia de que uma discípula do guru o estaria acusando de abuso sexual.


O guru, como de praxe, já reuniu o  séquito, apresentou seus argumentos sobre o ocorrido, e resolveu entrar em recesso.


Sem entrar no mérito desse caso específico, mas o ocorrido não é novidade.


Quem conhece um pouco sobre os bastidores da vida de gurus, como o Osho, por exemplo, sabe disso.


A geração atual, sedenta por um sentido de vida, insatisfeita com as religiões tradicionais, cai fácil no marketing espiritual de pretensos iluminados.


Voltemos ao Janderson.


O guru, entre 2008 e 2010, teria se relacionado sexualmente com uma devota casada, durante 2 anos, a título de terapia tântrica, para auxiliá-la em seu relacionamento com o marido, que por sua vez também é devoto do guru.


O casamento acabou, a devota, após passar por depressão e pânico, buscou tratamento psicológico tradicional, e chegou a conclusão de que o guru teria abusado sexualmente dela, utilizando seu poder psíquico pessoal.


Um cenário de altíssima espiritualidade, não é mesmo ?


Não tenho nada contra sexo, e nem acho que pessoas espiritualmente elevadas devam ser celibatárias.


Portanto, se o guru tem vida sexual ou não, é problema dele.


Quanto ao Tantra, duvido que atualmente exista algum mestre autêntico.


Creio que alguém que atribui a si mesmo a responsabilidade de ser um lider espiritual, deve ter a elevação moral e ética necessária para isso, e eu pessoalmente não considero, que ceder a tentação de manter relações sexuais durante dois anos com uma mulher casada seja uma atitude de alguém elevado, ainda mais pelo fato da mulher e do marido serem seus discípulos.

 
Complicado né ?

Mas vamos a história da minha breve relação com o Janderson.


Acompanho o trabalho do Janderson desde 2005.


O conheci através do meio daimista, do qual fiz parte.


Devido a minha inexperiência, me  identifiquei com os ensinamentos, que seduzem pela aparência de profundidade.


Na mesma época me informei sobre outros gurus, como o Osho, Sai Baba etc.


Os primeiros satsangs em que fui tinham uma média de 50 a 100 pessoas.


No início da caminhada espiritual é normal achar que necessitamos de guias, gurus, mestres.


Nos sentimos inseguros e saímos em busca de muletas.


O tempo foi passando e fui amadurecendo, estudando, me aprofundando não só no meu estudo interno, no autoconhecimento, como comecei a conhecer melhor a história do Janderson, o funcionamento de sua organização espiritual.


A cada satsang, o público duplicava, triplicava.


Marketing do boca-a-boca e também um bom marketing digital.


Enquanto eu me limitava a ir aos satsangs(quando gratuitos), ler a transcrição dos satsangs pelo site da organização, estava tudo tranquilo.


Até que chegou o momento de querer me aproximar mais das atividades internas, cursos e vivências.


Frustração total.


Valores muito acima das possibilidades de quem ganha pouco.


Tudo muito caro.


Aí percebi que o trabalho dele é direcionado mais especificamente para quem possui melhor situação social e financeira.


Mas  a verdade não é propriedade de ninguém, muito do que ele diz é válido, está de acordo com o que tantos outros já disseram, cada um com o seu colorido particular, e eu continuei o  acompanhando pelas redes sociais.


Só que a "verdade"  transmitida por Janderson, não cumpre o que a  Verdade proporciona.


A liberdade.


Todo mestre autêntico sabe que todos devem ser mestres de si mesmos e oferece o material necessário para isso.


O mestre só auxilia, prepara, põe setas no caminho.


Janderson diz tudo isso, mas induz a práticas que tornam seus seguidores cada vez mais dependentes.


Sim, tem gente grudada na barra da túnica  do Janderson há  mais de 20 anos.


Portanto ele fala em liberdade mas não a proporciona.


Padrão "Osho" de iluminação.


Osho levou ao extremo sua megalomania gurusística.


Quase tudo o que Osho ensinava era plágio descarado de Krishnamurti, um pensador indiano que nunca atribuiu a si mesmo o título de guru, mestre ou iluminado, e que sempre deixou claro a sua visão de que o ser humano não necessita de gurus.


Osho manteve relações sexuais com várias discípulas durante muito tempo, incentivava a prática de sexo grupal, orgias, como terapêutica libertadora, tinha mais de 90 Rolls-Royces a sua disposição, comprados com dinheiro doado as comunas que ele dirigia.


Também pregava a liberdade mas ninguém alcançou a liberdade através dele, de seus ensinamentos e das várias técnicas que ele desenvolveu.


Houve suicídio, pessoas a beira da loucura e o próprio Osho terminou seus dias na Terra de modo triste.


Só a Verdade liberta e ninguém tem o poder de proporcionar a experiência da Verdade prá ninguém.


Esse é um trabalho individual e intransferível.


A questão, portanto,  não diz respeito a julgamento, e sim, a precaução.


Quando alguém alcança a posse de um forte magnetismo espiritual, de dons e faculdades poderosos,  através de anos de várias práticas e exercícios espirituais, mas tendo ainda muitos pontos fracos a serem trabalhados se  autoproclama um iluminado, um guru e assume prá si a responsabilidade de guiar e iniciar pessoas e se utiliza de seu poder para manipular, explorar financeiramente e sexualmente as pessoas, a coisa é muito séria.


Auto-sugestão é um fato.


Há também os que se submetem a certas coisas, de livre e espontânea vontade, por se identificarem, por concordarem com tais práticas. 


Esses nunca farão denúncias por algum tipo de abuso, a não ser por algum interesse escuso. 


Mas fui várias vezes aos "satsangs" do Janderson, tanto no Ashram dele em Nazaré Paulista quanto a outros realizados em São Paulo.


Conheci muitas pessoas. 


Porcentagem alta de pessoas bem  resolvidas financeiramente, mas mergulhadas em profundas crises existenciais, em depressão profunda, muitos a beira do suicídio e tantos outros problemas. 


Ou seja, pessoas altamente vulneráveis, susceptíveis. 


Essas pessoas, em seu desespero, são levadas por amigos ou pelo marketing intensivo, a estes locais sem terem noção de onde estão se metendo.



Qualquer líder, dirigente, mal intencionado, de caráter suspeito, dotado de um poder mental, psíquico ou espiritual, pode vir a tirar proveito disso conforme sua índole.

No meio ayahuasqueiro já aconteceu muito disso, e grandes prejuízos foram causados a muitas pessoas.


Janderson não é um  guru, de acordo com o que essa palavra realmente representa na tradição hindu.


A questão da linhagem ao qual ele pertence e a transmissão da autoridade do Maharaj para ele, é um fato controverso.


Janderson é alguém com muita experiência em yoga, psicologia, espiritualidade, xamanismo daimista, hinduísmo etc.


Possui um grande conhecimento teórico e prático na espiritualidade.


Desenvolveu vários dons.


Se ele tivesse assumido a postura de ser simplesmente o que ele é, um dirigente, um facilitador, um terapeuta, estaria tudo bem, mesmo com o ocorrido.


Mas ele resolveu vestir a máscara de guru, iluminado, autorrealizado, santo (sim, ele já afirmou ser tudo isso).


Juntou os ingredientes necessários e adotou o estereótipo de guru indiano, tão ao agrado dos buscadores incipientes.


Barba comprida, indumentárias hindus, fala mansa, ritos védicos, mantras, satsangs, e um bom marketing espiritual.


Manteve um pouco da sua ligação com o Santo Daime, que de acordo com ele, o ajudou chegar a tão sonhada iluminação.


Quando o ego espiritualizado sonha em se tornar iluminado e se esforça nesse sentido, chega um momento em que ele realmente acredita que alcançou.


É quando ouvimos alguém dizer euforicamente : " Eu me iluminei".


Até que a vida, com sua cruel indiferença aos nossos devaneios, vem e nos mostra o que realmente somos.


Na Iluminação, de acordo com o que os autênticos mestres dizem sobre isso,   não há mais um "eu" prá dizer "me iluminei", "sou iluminado".


É a extinção do ego humano.


A personalidade humana cede lugar a Consciência Universal.


O Janderson nunca deixou de ser o Janderson, apenas mudou de nome quando, no auto-engano ou por ambição, autoproclamou-se um iluminado.


Aí um indivíduo desse, conhecedor que é das vulnerabilidades humanas dos que o seguem, os convence de confiarem plenamente nele, entregarem suas vidas a ele.


O resultado já conhecemos.


A Lei do Karma, da  qual esse pretenso guru tanto fala, é inexorável, e já está em ação.


Mais uma vez repito: usar de poder espiritual para manipular massas de  pessoas suscetíveis é um crime perante as leis universais.


Que esse fato, já tantas vezes ocorrido com outros pretensos iluminados, traga as lições necessárias a todos nós.